Quando se fala em reajuste de plano de saúde, um ponto bastante controverso diz respeito à aplicação do índice de sinistralidade. Mas, o que significa esse índice? Como ele é utilizado pelas operadoras? O que diz a legislação? Nesse artigo, daremos todos os detalhes sobre a aplicação do índice de sinistralidade nos reajustes das mensalidades dos planos de saúde.
O índice de sinistralidade é um fator crucial na definição dos reajustes anuais dos planos de saúde, sobretudo porque reflete diretamente o equilíbrio financeiro das operadoras de planos de saúde e a necessidade de ajustes nas mensalidades cobradas dos consumidores.
Recentemente, diversas operadoras de planos de saúde têm aplicado reajustes significativos nas mensalidades de seus beneficiários, justificando esses aumentos com base em altos índices de sinistralidade. Esse cenário tem gerado uma série de questionamentos e controvérsias, tanto por parte dos consumidores quanto por parte de órgãos de defesa do consumidor e entidades reguladoras. A principal questão que se coloca é se tais reajustes são justos e proporcionais, ou se configuram prática abusiva, onerando excessivamente os consumidores. Assim, a seguir, destacaremos alguns tópicos diretamente relacionados ao tema:
Definição e importância da sinistralidade
A sinistralidade é um índice que mede a relação entre as despesas com serviços médicos e o valor arrecadado pelas operadoras de planos de saúde. Inegavelmente, trata-se de um indicador considerado crucial para a sustentabilidade financeira das operadoras, pois reflete a utilização dos serviços pelos beneficiários e os custos associados a essa utilização.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS),órgão que regula as operadoras de planos de saúde no Brasil, através de suas normativas, reconhece a sinistralidade como um dos fatores que podem influenciar o reajuste das mensalidades dos planos de saúde.
Base legal para reajustes de planos de saúde
O reajuste dos planos de saúde é regulado pelaLei nº 9.656/1998, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.
Nesse sentido, a ANS, no exercício de sua competência, emite resoluções normativas que especificam os critérios e limites para esses reajustes. A Resolução Normativa nº 309/2012, por exemplo, detalha os parâmetros para reajustes de planos coletivos. Já para os planos individuais ou familiares, a ANS estabelece anualmente os percentuais máximos de reajuste.
Critérios de reajuste e o índice de sinistralidade
A aplicação do índice de sinistralidade como critério para reajuste deve ser feita de maneira transparente e justificada. As operadoras devem demonstrar a necessidade do reajuste com base em fatores como a variação dos custos assistenciais, a frequência de utilização dos serviços e a incorporação de novas tecnologias.
Posto que a transparência e o direito à informação são garantidos aos beneficiários dos planos de saúde, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078/1990, artigo 6º, inciso III, as operadoras de planos de saúde, ao aplicarem reajustes, devem fornecer aos beneficiários informações detalhadas sobre os critérios utilizados. Ou seja, elas devem divulgar a metodologia de cálculo da sinistralidade, os fatores que contribuíram para o aumento das despesas e a conformidade com as diretrizes da ANS.
Desse modo, ao justificar o reajuste com base no aumento da sinistralidade, a operadora de plano de saúde deve apresentar um relatório detalhado que demonstre a conformidade dos procedimentos adotados comas normativas vigentes. A Resolução Normativa nº 171/2008 da ANS, que trata da transparência e da qualidade das informações prestadas pelas operadoras, reforça a obrigatoriedade de clareza e precisão nas comunicações aos beneficiários.
Consumidores podem questionar reajustes?
Como vimos, a equidade e a exigência de justificação na aplicação de reajustes estão amparadas legalmente. Então, os consumidores têm o direito de questionar aumentos que considerem desproporcionais ou inadequadamente justificados.
O CDC, em seu art. 39, inciso V, proíbe práticas abusivas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. Nesse sentido, a operadora deve demonstrar que o aumento na sinistralidade reflete efetivamente um aumento nos custos assistenciais e que os reajustes aplicados são necessários para a sustentabilidade do plano, sem onerar excessivamente os beneficiários.
Precedentes judiciais e administrativos
Para além do aspecto legal, diversos precedentes judiciais e administrativos apontam para a necessidade de equilíbrio entre a sustentabilidade financeira das operadoras e a proteção dos direitos dos consumidores.
Tribunais têm reiteradamente decidido que os reajustes devem ser justificados de forma transparente e que os consumidores têm o direito de ser informados adequadamente sobre os critérios utilizados. Decisões recentes têm enfatizado a importância de uma comunicação clara e detalhada, que permita aos beneficiários entenderem os motivos dos aumentos e verificarem a sua conformidade com as normativas da ANS.
Conforme recebem questionamentos e reclamações dos consumidores, a ANS inicia processos administrativos para averiguar a legitimidade dos índices apresentados pelas operadoras. Esses processos envolvem a análise detalhada dos relatórios de sinistralidade e dos critérios de reajuste, verificando a conformidade com as resoluções normativas e com os princípios de transparência e equidade. A ANS pode, inclusive, solicitar ajustes nos percentuais de reajuste aplicados ou determinar a devolução de valores cobrados indevidamente.
A comunicação entre operadora e beneficiários
Para que as operadoras assegurem que os beneficiários compreendam os motivos e as justificativas para os aumentos aplicados, elas devem adotar práticas de comunicação eficazes. A falta de transparência na comunicação, aliás, pode ser considerada uma prática abusiva, passível de sanções pela ANS e de ações judiciais pelos consumidores.
Nesse sentido, há diversas possibilidades eferramentas de comunicação que as operadoras devem fazer uso. Abaixo, algunsexemplos de boas práticas:
1. Relatórios Detalhados: Disponibilizar relatórios detalhados que expliquem a metodologia de cálculo da sinistralidade e os fatores que contribuíram para o aumento das despesas. Esses relatórios devem ser claros e acessíveis, para que permitam que os beneficiários compreendam as razões dos reajustes.
2. Reuniões Informativas: Promover reuniões informativas com os beneficiários para explicar os critérios de reajuste e responder a eventuais dúvidas. Essas reuniões podem ser realizadas presencialmente ou por meio de plataformas virtuais, garantindo a participação de todos os interessados.
3. Canais de Atendimento: Manter canais de atendimento eficientes para o esclarecimento de dúvidas e a resolução de problemas relacionados aos reajustes. Esses canais devem ser acessíveis e bem divulgados, permitindo que os beneficiários obtenham informações de forma rápida e eficaz.
4. Transparência na Comunicação: A comunicação sobre os reajustes deve ser feita de maneira transparente, utilizando linguagem clara e objetiva. As operadoras devem evitar jargões técnicos e fornecer informações de forma compreensível para todos os beneficiários.
Oque fazer em caso de reajustes abusivos?
Os consumidores que considerarem os reajustes aplicados abusivos ou inadequadamente justificados têm à sua disposição diversas medidas para proteger seus direitos. Entre as principais medidas, destacam-se:
Reclamação junto à ANS: Formalizar uma reclamação junto à ANS, solicitando a revisão dos critérios utilizados pela operadora para justificar o aumento. Primordialmente, a ANS possui competência para averiguar a legitimidade dos índices apresentados e a conformidade dos reajustes com as normativas vigentes.
Ação judicial: Ingressar com uma ação judicial visando a revisão dos reajustes aplicados. Os consumidores, então, podem pleitear a devolução de valores cobrados indevidamente e a reparação por eventuais danos sofridos. A ação pode ser fundamentada nos princípios de proteção ao consumidor estabelecidos no CDC, especialmente no art. 39, V, que proíbe práticas abusivas.
Propositura de ações coletivas: Em casos em que há grande número de beneficiários afetados, pode ser vantajoso propor ações coletivas. Essas ações podem ser movidas por associações de consumidores ou pelo Ministério Público, visando a proteção dos direitos difusos e coletivos.
Negociação com a operadora: Buscar uma negociação direta com a operadora, visando a obtenção de um acordo que seja satisfatório para ambas as partes. Nesse contexto, a mediação pode ser uma ferramenta útil ara a resolução de conflitos.
Conclusão
Em síntese, a análise da influência do índice de sinistralidade no percentual de reajuste dos planos de saúde revela a complexidade e a importância de um equilíbrio justo entre a sustentabilidade financeira das operadoras e a proteção dos direitos dos consumidores. Desse modo, a conformidade com as normativas da ANS, a transparência na comunicação dos critérios de reajuste e a observância dos direitos à informação clara e adequada são elementos fundamentais para garantir que os reajustes sejam justos e proporcionais.
Ademais, os precedentes judiciais e administrativos fornecem importantes orientações sobre como os tribunais e órgãos reguladores têm interpretado essas questões, reforçando a necessidade de práticas transparentes e equitativas. As operadoras devem adotar medidas eficazes de comunicação e os consumidores têm à sua disposição diversas ferramentas para proteger seus direitos em caso de reajustes considerados abusivos.
Portanto, a resolução dessa controvérsia exige uma abordagem cuidadosa e detalhada, que leve em consideração tanto os aspectos técnicos e econômicos quanto os direitos dos consumidores e as normativas aplicáveis. A busca por um equilíbrio justo e transparente é essencial para garantir a sustentabilidade do sistema de saúde suplementar e a proteção dos direitos dos beneficiários.